quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Quanto mais se escreve, mais se pensa...

Há dias ao ler um ensaio de António C. da Silva sobre "A escrita e o saber" deparei com algumas afirmações que me levaram a meditar profundamente, já que também sou pessoa que gosta de escrever.
Esse trabalho inicia com uma citação de Paul Valéry, incerta no Dicionário de Citações, de Florence Montreynaud, que diz: Quanto mais se escreve, menos se pensa". No meu entender trata-se de uma afirmação estranha, uma vez que não posso dissociar o pensamento da função escrever.
A escrita, mesmo não sendo pessoal nem livre, constitui, efectivamente, um bom exercício intelectual de criação e de representação permanentes do conhecimento.
Compreendo as divagações dos autores nessa matéria, todavia, sou defensor de que "Quanto mais se escreve, mais se pensa". Devemos sempre acreditar na escrita como forma de conhecimento e de pensamento, mas também como teia que nos limita e nos separa da vivência livre do pensamento vago, como afirmou Lionel Bellenger: "Escrever é falar de si através do estilo, das palavras, é uma forma de pensar, mas escrever é também atravessar uma selva de princípios, de regras, de usos e de conveniências".
São estas e outras razões que obrigam quem tem a responsabilidade de escrever comunicando, a pensar antes de o fazer. Concordo absolutamente com a opinião de Bellenger, quando diz: "Escrever é atravessar uma selva de princípios...", que o digam os profissionais da nossa comunicação social.
Este ano tem sido farto em notícias bombásticas (Apito Dourado e Apito Final, Corrupção na Arbitragem, Divulgação de Segredos de Justiça, Avaliação dos Professores, etc.), os jornalistas por esses factos, são levados a elaborarem grandes reportagens e artigos de fundo, é óbvio que os seus artigos têm que se sustentar em factos concretos, em pesquisas aturadas, rocambolescas por vezes e em exercícios de pensamento que lhes permitam, com fluência demonstrar aos seus leitores, a veracidade e a autenticidade das suas notícias.
Ao falar da escrita importa lembrar, antes de mais, nos diversos tipos de pessoas que se dedicam ao árduo trabalho de escrever. Há, os que escreve, por vocação (escritores) e os que escrevem por obrigação (escreventes). Os primeiros escrevem para pensarem melhor e os segundos pensam para escrever melhor; aqueles conhecem o seu pensamento, estes pensam no seu conhecimento; os escritores vivem para escrever e os escreventes para (poder)viver.
Apesar de tudo, é evidente que a língua e o Mundo, a escrita e o saber podem, de facto, não estarem associados.
Pensemos nos analfabetos, nos que desconhecem a escrita e poderíamos achar que eles não pensam nem sabem, mas, na realidade, pensam bem com os seus sentidos e conhecem perfeitamente o seu mundo existencial, que captam graças a outros meios de fixação da realidade.
Há gente dita analfabeta que muito sabem, sem terem sido ensinados!
Concluindo. pode-se afirmar mesmo não concordando com aquela citação, que Paul Valéry tem as suas razões para sustentar que a escrita e o pensamento são, de certo modo incompatíveis, porque há aqueles que escrevem e não pensam, mas há também os que pensam sem saber escrever.
Campo Maior,19 de Novembro de 2008
siripipi-alentejano

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