sábado, 24 de abril de 2010

LIBERDADE SEMPRE...

Comemora-se hoje o 36º. Aniversário da Revolução dos Cravos, muitos são os que recordam com saudade essa memorável noite e é imperioso que se continue a recordar esse dia e os que, não sendo militares, lutaram activamente, alguns na clandestinidade, para que a democracia fosse uma realidade em Portugal.
Em Abril de 1974 encontrava-me em Angola aí vivi, como Militar e Civil, de Outubro de 1968 a Abril de 1976, conheci muita gente e muitos deles eram pessoas que sempre lutaram pela democracia e até pela auto determinação das antigas Colónias.
O meu trabalho de hoje destina-se a recordar e homenagear um lutador pela liberdade. Foi um dos seus livros de poesia que serviu para epigrafar o meu Blog.
SIRIPIPI NA GAIOLA
Na vida das pessoas há ocasiões que nos levam a reviver o passado e a meditar sobre episódios já vividos.
Recordar é viver, diz o Povo, este provérbio leva-nos a divagar nas boas e más recordações. Muitas vezes são conhecimentos do presente que nos remetem a factos do passado, levando-nos por isso a compará-los com a vida do dia- a- dia.
Os anos passaram e esses fazem hoje a história da nossa vida. Já decorreram 42 anos sobre a minha ida para Angola em missão militar obrigatória, foram 26 meses vividos em Luanda, aí tive o grato prazer de conhecer e fazer muitos amigos, conviver e formar tertúlias, pois tornava-se necessário viver o tempo, de ultrapassar a saudade de estar longe da família, do seu carinho, da nossa Terra, dos amigos de sempre.
Nesse tempo em Angola ainda não havia televisão, os tempos livres ocupavam-se ouvindo rádio, frequentando cinemas, bares, passeando pelas magníficas praias ou então cavaqueando amenamente à mesa de um café.
Foi num café da baixa de Luanda, que casualmente conheci um grupo, tornei-me de imediato amigo de todos, passando a conviver com eles, no entanto entre eles havia um que sobressaia pela maneira de estar na vida, pela sua cultura, pelo amor à sua Terra e ainda por ser um revoltado politicamente, era ERNESTO LARA FILHO um dos grandes poetas Angolanos, irmão de uma das mais afamadas poetizas daquela época, Alda Lara.
Ernesto Lara Filho, angolano de nascimento, filho de Portugueses, Regente Agrícola de profissão, era um homem de vistas largas, poeta irreverente, amante de bem viver, viu-se expulso da Função Pública, por ser amante da liberdade, por não pactuar com as ideias do regime, por gostar da democracia, da sua Angola independente e sofreu na pele as agruras do Campo de São Nicolau, enfim, foi um frequentador assíduo das masmorras da PIDE/DGS.
Nos nossos contactos, entre conversas em surdina à mesa do café, o Jara de Carvalho, o Africano Rodrigues e o Ernesto Lara Filho, confidenciou-me as dificuldades que estavam vivendo por serem defensores da Liberdade, a forma como eram preteridos quando buscavam emprego e a perseguição sistemática que a polícia política lhes movia.
Quando cheguei a Angola em 1968, Ernesto Lara Filho tinha acabado de sair do Campo de São Nicolau onde cumpriu, como ele dizia, umas férias forçadas, além de também esse facto ter conduzido à demissão do cargo que ocupava num organismo público do Governo Provincial.
A solidão daqueles meses de desterro e a falta de liberdade reforçaram os seus sentimentos, enriqueceram a sua força anímica, permitindo-lhe que escrevesse uma das mais belas obras poéticas, o SIRIPIPI NA GAIOLA, cujo lançamento tive o prazer de assistir, a seu convite.
Certo dia falamos sobre a sua obra e referiu-me que o Siripipi é uma pequena ave de penagem multicolor, cantador nato, abundante no sul de Angola, que deambula de árvore em árvore e o poeta seguia-o diariamente, o Siripipi era como ele, um amante da liberdade, era o seu conforto no infortúnio de um dia de São Nicolau.
A poesia de Ernesto Lara Filho, neste livro, é um grito de revolta à brutalidade que os ditadores impõem à sociedade, é um hino à liberdade e ao mesmo tempo é também uma miragem de tristeza se a vida de um siripipi estivesse em cativeiro numa gaiola.
Eu adivinhava o seu pensamento nas palavras que me dirigia!
Ninguém pode imaginar quão difícil é viver sem liberdade, quão difícil é querer falar e escrever e não lhe ser permitido fazê-lo, quão difícil é acumular infinitamente factos, histórias verídicas e ser pressionado a não poder divulgá-las, quão difícil é admitir sevícias por defender a liberdade, desejar uma igualdade de deveres e direitos para os Angolanos e Portugueses ali residentes, de todas as raças e credos.
É tudo isto que mata quem é amante da liberdade e da democracia, quem gosta de viver e quem mesmo vivendo em liberdade, também se vê inibido de poder transmitir verdades, em nome dessa liberdade.
O ser humano, os animais e as aves, não se fizeram para viver em cativeiro, todos têm direito a serem livres, a viver a sua vida ao sabor da natureza, podendo exteriorizar os seus sentimentos a seu belo prazer tal como o sentem.
Ernesto Lara Filho sentiu esses problemas, teve uma vida difícil, faleceu no Huambo em 7 de Fevereiro de 1977, mas ainda conseguiu viver a liberdade nascida em 25 de Abril de 1974, viveu os tempos difíceis que se seguiram à independência da sua Angola e posso afirmar que levou consigo para a cova, uma grande mágoa porque a sua mensagem de liberdade não ter sido compreendida e assimilada, os homens da sua Terra ainda não compreenderam que devem dar as mãos e lutar para o desenvolvimento e bem-estar de todos os Angolanos, que deviam acabar com a fome e a guerra e criar uma vivência de amor e paz para todos.
Ernesto Lara Filho foi um bom amigo, as suas obras fazem-me meditar e compreender as dificuldades de uma vida de luta pela liberdade e pela livre expressão de ideias, eu próprio também algumas vezes penso e sofro como ele, enfim, a vida á assim, e devemos estar preparados para ela.
Que o dia de hoje continue a ser comemorado, este texto é igualmente uma homenagem de respeito e reconhecimento pelos Militares de Abril e por todos os que durante a ditadura de Salazar, ausentes da Pátria e vivendo com nostalgia, lutaram e contribuíram para que Portugal seja um País Democrático e de Liberdade.
Siripipi-alentejano

10 comentários:

Anónimo disse...

em primeiro lugar quero dedicar algumas palavras ao srº siripipi tudo o que está escrito tem a verdade e é bom que se recorde temas como estes,parabens.
mas já agora queria deixar aqui uma pergunta ao srº haverá liberdade em Campo Maior? depois de 36 anos que se deu o 25 de abril
eu penso que não?
nota-se na rua as pessoas a ter medo de dar opiniões, como o srº diz e muito bem ninguem deveria de ter medo e livremente podessem dar as opiniões oportunas e sinceras,para o bem sempre da nossa terra. a PIDE ACABOU MAS OS BUFOS CONTINUAM EM FORÇA

siripipi alentejano disse...

Caro anónimo das 16H43, eu compreendo a sua preocupação e das entrelinhas do seu comentário retirei algumas ilações. Hoje é o dia da Liberdade, é o do nascimento da democracia.
Apesar disso reconheço que em determinadas matérias, alguns pseudo-democratas defendem outra vertente da democracia, a autocracia e esta aproxima-se do quero mando e posso.
Julgo que em matéria de liberdade em Campo Maior não há nenhum défice, todavia, nas suas palavras e no que se refere (bufos) infelizmente sempre os houve e esses são párias da sociedade.
siripipi-alentejano

Anónimo disse...

Sôtora ...

O dia da liberdade já passou?

- Este ano, sim.

Puff ! Ainda bem .

- Bem ! porquê ???

... Oh Sotôra ! porque assim, já não vamos ter défice !

Anónimo disse...

Até a água das fontes secam...


Não sei o que dá nesta gente, que nos dias 25 de Abril ,todos se põem a cantar, a deitar fogo de artificio, a apodar-se de democratas, a colocar cravos (até de papel) na lapela, como se esta” cagança” de vestir gravata, camisa engomada, calça vincada e sorriso parado no tempo de quem lhe saiu momentaneamente o euro-milhões, da subserviência em que caiem , fosse mais importante , do que colectivamente beber - conscientemente - um pouco da pobre realidade em que vegetamos inconscientemente toda uma vida.

Fomos assim ao longo de séculos. Gente sem emenda . Gente a quem desmamaram a cultura e a razão desde que aprendemos a gatinhar; vivemos diariamente ao sabor de rebuçados recheados com pura droga que as TVs e o poder nos oferecem de mão beijada... do sabor de chicletes com os golos do Benfica ou dos pontapés dum qualquer “Falcão” ... ou esperando individualmente eternamente por milagres que hão-de cair do céu, e que - agora a propósito - já se anunciam estridentemente com a mais útil e fervorosa pompa, com a vinda a Portugal do “Santo Padre”.

Descansemos pois. Reservemos o nosso lugar no Marquês ou no T.Paço.
Estamos “safos”, por mais três ou quatro semanas.

Ou como prevendo... diria ( noutro contexto) o seu amigo Ernesto Lara:

“Diz a tua Mãe
que o menino branco
um dia há-de voltar
cheio de pobreza e de saudade
cheio de sofrimento
quase destruído pela Europa “


Ou Agostinho Neto...

“Possuis tudo TUDO /e sois todos irmãos/Continuai com os vossos sistemas políticos/ditaduras democráticas/isso é convosco/Explorai o proletariado/matai-vos uns aos outros/lutai pela glória/lutai pelo poder/criai minorias fortes/apadrinhai os afilhados dos vossos amigos/criai mais castas/aburguesai as ideias/e tudo sem a complicação/ de verdes intrusos/imiscuir-se na vossa querida e defendida civilização de homens privilegiados”


...ontem ; foi irreal, chocante e piroso, ver os cravos de papel, amalgamados no verde dos bróculos Presidenciais...
Francamente!

Dr. Estranho Amor disse...

Apenas duas achegas em jeito de contraditório (subscrevo o restante) sobre o comentário do Sr. Anónimo das 19.46 H:


1)Agostinho Neto, ecce hommo, incontornável humanista e defensor das liberdades. Não lhe soneguemos calorosos panegíricos apenas por ter executado milhares de pessoas. Shit Happens. Curioso que o cite a pretexto de comentar escritos sobre a liberdade. Liberdade poética, suponho?


2)Omite o Sporting da lista de drogas nacionais de forma consciente?

Anónimo disse...

Ao anónimo das 19.46 os meus parabens. Estas sim são palavras
sábias. Porque estas especies de vivências relatadas neste Blog, são muitas vezes incompletas.
Passaram por Angola, como militares, muitos Campomaiorenses que contam muitas histórias vividas por párias da sua terra, em terras africanas.

Anónimo disse...

Quantos aros terá, o raio da roda da carroça ?

Ecce Homo; Dr. do Amor

...devia saber que no xadrez os bispos não se deslocam (aos peões) por acaso...

...e como tem Dr. eventualmente não terá ceptro... e como o amor nunca é irónico !....

E isto tudo sem sarcasmos...sejam abençoados pelo tédio, ou por espíritos de anjos magoados.

Assim ... continue a fitar de preferência com olhos de intimidade as suas “abetardas” talvez - quem sabe – nesta latitude e longitude, a paisagem e os ventos de Éolo nos auxiliem a chegar – desatentamente - a um sistema comum de sonhos de liberdade, ou de contingências cósmicas totalmente realizáveis .

Mas ... com a condição antecipadamente aceite, que os pontapés da “clubite” - não o façam quedar prostrado na relva verde (vê já escrevi verde ) do bet(inho) branco em missão de serviço imobiliário, do banco com lucros de 23mil €/hora, (pasme-se) legalmente, e com as palmas, dinheiros e votos, dos muitos pobres ( pobres mesmo) sofredores.

Se até aqui chegar a indiferença e “inconsciência”, provavelmente alcançará - e se baterá - pelo império de César, aqui tão próximo, e que a todos seduz.

... contudo aviso que ( como tudo na vida ) será supérfluo.

Ah ! e venha de lá esse contraditório ! ...discutido por loucos, com devaneios loucos!

... nunca contraditórios tipo magno, delgados e quejandos, que são conquistados : uns , pelas chamas dos céus infernais, e os “quejandos” - como Proserpina - pelos sonhos amorosos de Dis.


... se precisar de anilhar as abetardas ,diga.

Bom almoço !

... hoje o meu é feijoada, e pelo aspecto fumegante, vai "deixar-se" comer bem !

Dr. Estranho Amor disse...

E não há nenhuma agência internacional que baixe o rating do Mourinho, ecce hommo?

Entrando no sempre fascinante mundo dos delgados, magnos, pachecos, bettancourts,rogeiros e demais tropa fandanga…

Espero que essa digestão tenho sido um sucesso. Começam a ser lendárias as suas aventuras pantagruélicas mas olhe que estas exibições salivares, dignas do José Quitério, podem acordar o jacobino gastronómico que há dentro de muitos. Evite,pois, tomar a nuvem por Juno. Nem tudo o que “fumega” é delicioso.

Também para não andar uma vida a tentar fazer e a esquivar xeques-mate, nem a esconder as nossas Torres dos bispos, cavalos e peões de brega que nos rodeiam, deixemos o xadrez para outras núpcias, que de bispos a comerem pequenotes estamos fartos. Jogue-se antes às Damas. Se apreciar a variante, como é evidente.

E as abetardas, ui as abetardas. “Mas são abetardas de Coimbra!”, diria o Professor Doutor da mesma cidade, o grande (fisicamente) Almeida Santos. Desperdiçar anilhas nestes bichos seria péssima gestão de recursos. Agradeço a gentil oferta, mas reserve as anilhas que outros “pássaros” de maior porte e muito apreciadores de água com cheirinho a cloro, poderão necessitar delas. Até há quem diga que as anilhas serão insuficientes para tais exemplares e vão ser necessárias “gaiolas”. Mas isso são contas (ou balancetes) de outro rosário.

E agora, se me permite, vou almoçar ao Mc Donalds. Não terá a sensualidade gastronómica da sua feijoada mas também tem algum encanto. E não produz flatulências, o que não deixa de ser um alívio para mim e um motivo de preocupação para as agências de rating.

Ah, e toca a cortar as unhas dos pés pois parece que brevemente vamos a banhos. Que na piscina não nos tomem por “águias”.

Isabel Santos disse...

Siripipi?
No Alentejo?

Siripipi só conheci um "O Siripipi Angolano".
Era eu menina e moça, mas lembnro-me perfeitamente dele, meu pai e outros em amena cavaqueira, quando ele se lembrava de ir ao HUambo visitar os amigos e família.
Tenho à minha frente a única revista (NOTÍCIA-24 de Setembro 1966) que guardei, e nela vem uma das muitas crónicas do Ernesto Lara:Um Siripipi Angolano e a menina do Chapeúzinho Vermelho.

siripipi alentejano disse...

D. Isabel Santos
O facto do meu Blogue se chamar Siripipi-Alentejano, é uma homenagem ao meu grande e ilustre amigo Ernesto Lara Filho, infelismente já desaparecido. Guardo imensas recordações dos anos que com ele privei, por isso, LIBERDADE SEMPRE...
siripipi-alentejano